7. Da percepção emotiva à compensação simbólica

Numa situação de conflito, o cérebro recebe um certo tipo de informações que deve gerir. Mas ao funcionar com uma linguagem específica (arcaica), mal capta a Percepção Emotiva vivida pela pessoa opera uma tradução dessa percepção a partir dos seus filtros biosimbólicos. É como se tivesse um teclado com um número limitado de teclas para interpretar o que lhe é transmitido e cada tecla correspondesse a uma percepção emotiva biológica precisa. Ao carregar numa tecla realiza-se uma conversão que se repercute sobre um determinado órgão ou sistema, conversão orgânica que altera o funcionamento celular do órgão seleccionado. Por exemplo, se a percepção emotiva veicular um “forte medo de morrer” automaticamente a tecla biológica que gere este tipo de vivido activa a conversão orgânica na função bronco pulmonar, onde uma “multiplicação dos alvéolos pulmonares”, por exemplo, pode ocorrer. Com efeito, sabemos que basta ficarmos uns segundos sem ar para sentirmos medo de morrer; multiplicar o número de captadores de oxigénio constitui, assim, uma solução de sobrevivência. Simbolicamente, a alteração celular nos pulmões compensa uma deficiência que origina o medo de morrer: à partida, a pessoa que se sente segura não tem medo de morrer e por isso não precisa da compensação simbólica!

Identidade orgânica

Da mesma forma que os pulmões alteram o seu comportamento funcional e celular para responderem a um “medo de morrer por falta de ar ou de espaço para respirar”, cada órgão tem uma identidade própria intimamente ligada à sua função biológica. Se a função do cólon consiste em concentrar os resíduos inassimiláveis da digestão que serão quase integralmente eliminados, isto implica que quando uma pessoa atravessa uma fase de vida com uma dificuldade em eliminar coisas inaceitáveis (insultas, vexames, sujidades, golpes baixos…) é normal que a função do cólon venha a alterar-se conforme a intensidade da perturbação.

O braço que acolhe, abraça, protege, afasta o perigo, segura… pode modificar-se estruturalmente (tecidos) ou funcionalmente (insensibilidade, tremor, paralisia…) quando uma pessoa entra em sofrimento, ao ver-se impedida (ou obrigada) de realizar como deseja uma destas funções.

O seio tem, como função principal, garantir a segurança da família, a nutrição do outro, a protecção materna do ser frágil ou em perigo e que deve sobreviver. Assim, de cada vez que um membro da família (filho, marido, mãe, irmã, cão…) provoca numa mulher um sentimento aflitivo de protecção, de “maternar” esse vivido potencializa uma alteração da função mamária.

A enervação cutânea serve para sentir o contacto de proximidade ou íntimo, identificar a presença do outro. Por isto, nas situações que provocam uma “ruptura do contacto confortável”, a pele responde ao distress modificando a sua estrutura ou o seu funcionamento.

Uma Humilhação

Um funcionário de liceu foi humilhado pelo director à frente dos colegas. Nesse preciso momento sentiu-se de tal forma agredido, que não conseguiu responder- “foi como se tivesse levado uma bofetada na cara”. Consulta por causa de dores nevrálgicas do trigémeo, dores insuportáveis, repentinas e fulminantes na face. O sintoma localizado no rosto confirma a percepção emotiva deste homem: na verdade, a situação não foi vivida em termos respiratórios ou digestivos mas como um contacto doloroso de um golpe humilhante recebido na face, sem possibilidade de resposta: “levei uma vergonha na cara!”

Num primeiro momento, na fase do hiperstress, o cérebro identifica a categoria biológica do conflito. Nunca é demais repetir que esta é sempre dominada por um conflito de carácter vital- motor, digestivo, respiratório, visual, olfactivo, sexual, territorial, de impotência física, de perda de alguém, de morrer de fome, de apanhar um pedaço para sobreviver (ar, comida, som, etc.), de contacto/separação, de desvalorização. No caso presente, onde domina a sensação de “contacto violento e humilhante” (bofetada), o conflito integra a categoria nervosa e cutânea. Num segundo tempo, lança a resposta, isto é, a patologia adaptada (dor como provocada por um estalo) localizada com precisão (na cara).

Um Despedimento

Um senhor foi despedido. Consulta uns meses depois, por causa de um eczema. Com estas duas pequenas informações temos uma descrição dos factos objectivos. Mas, como referi já anteriormente, em terapia o relatório factual tem pouco valor. O que falta? Falta a Percepção Emotiva. Com efeito, este despedimento pode ser vivido de várias maneiras. Vejamos algumas:

  1. Se ele viveu a perda do emprego com cólera e sentimento de injustiça, pode apresentar alterações funcionais e/ou orgânicas nos canais biliares.
  2. se considera que perdeu o seu território de acção, a sua “razão de viver”, poderá desenvolver uma patologia cardiovascular.
  3. e tem dificuldade em aceitar o despedimento que lhe “custa a engolir “ e lhe “fica lá na barriga”, poderá sofrer patologias gastroesofágicas.

O verbo Poder tem de ser sublinhado: na verdade, a decisão cerebral que leva à somatização não é sistemática. Como já referimos anteriormente, ela depende de muitos outros factores: intensidade, estrutura psico-emotiva, experiências traumáticas anteriores, dificuldade em exprimir e gerir um conflito, etc.

Neste caso concreto, como foi vivido o despedimento? “Foi uma surpresa, mas não me incomodou muito porque já tencionava deixar o emprego e dedicar-me a uma nova actividade”. Verificamos que não há nenhum envolvimento afectivo perturbador no despedimento, nenhum conflito. A perda de trabalho (vivido), que poderia ter provocado um estado de depressão, não o afectou. Onde estará então a origem do problema?

Como explicar o problema de pele?

A pele é o órgão do contacto e, por isso, reage quando se dá uma separação. O eczema, que neste caso atinge a parte inferior das pernas, assinala a resolução de um conflito de separação. Que acontecimento ligado a uma separação terá provocado então o eczema? Este homem tinha um cão a quem estava muito ligado. Um ano antes teve de mudar para um apartamento pequeno e tratando-se de um setter, achou melhor colocá-lo num lugar mais propício e espaçoso onde pudesse correr à vontade. Deixou-o, então, na quinta de uns amigos. Foi muito difícil separar-se de um companheiro de há tantos anos e sentia-se só e desamparado. Estava habituado à presença e ao afecto do animal, que costumava dormir aos seus pés. “Era a minha companhia, dizia, com uma viva emoção, e a dificuldade da separação levou-o a arranjar um novo cão, mais pequeno, próprio para apartamento. O novo cão, que também adormece aos seus pés, solucionou o seu problema de separação. O eczema apareceu depois de ter o novo animal. Curiosamente, até à consulta, nunca foi capaz de sarar completamente, o seu estado oscilando sempre entre melhorias e recaídas. O sintoma só desapareceu definitivamente umas semanas depois da consulta.

O que aconteceu durante a consulta que viabilizou a cura?
para saber a resposta, ver O INCONFESSAVEL..