Lançamento do Livro: Diagnóstico - quando o impacto é destrutivo

capalivro4INTRODUÇÃO

Qual a razão deste livro?

A resposta não podia ser mais simples: fazendo o balanço de mais de vinte anos de prática terapêutica e de troca de experiência com colegas, verifico que o número de pessoas perturbadas ou mesmo destruídas depois de ouvirem um diagnóstico não para de crescer. O contingente de pessoas que receia as consultas, os resultados das análises, dos exames e que vai angustiado à consulta médica tem vindo a aumentar significativamente. É cada vez maior a apreensão quando se aproxima uma visita de rotina e o número de pessoas que adia a consulta marcada é bastante significativo. O que aconteceu para se ter chegado a esta situação? Por que razão   é cada vez mais escasso o número de pessoas que consulta o médico na esperança de obter conselhos capazes de proporcionar  alívio e consolo?  O que levou a calma e a confiança darem lugar ao pânico e à desconfiança quando se avizinha uma consulta médica?

Esta situação decorre, em parte, de um ambiente psicológico generalizado que favorece aquilo que eu designo de SOCIEDADE DO DIAGNÓSTICO: programas de rádio, de televisão, artigos na imprensa, ginásios,   gabinetes de estética, lojas de produtos naturais,  amigos, vizinhos e  família, de manhã à  noite  jorram de todo o lado diagnósticos a propósito de tudo e de nada. Por detrás desta verborreia insinua-se e induz-se um permanente sentimento de medo e de pânico e não é por acaso que constato, nos últimos anos, um número alarmante de pessoas a sofrer crises de ansiedade. Depois do futebol, não há hoje assunto que reúna mais adeptos à volta de uma mesa em debates acalorados. Mesmo aquelas ninharias a que ninguém prestava grande atenção, hoje são alvo de discussão sobre a melhor vacina, o melhor tratamento, o melhor médico. Sinal revelador dos tempos e da sociedade em que vivemos,  descrito de forma acutilante pela escritora Agustina Bessa Luís: a importância que a doença toma na vida de uma sociedade e das pessoas é uma forma de terror que lhes é imposta, que as pessoas compreendem bem  e que acabam por incorporar profundamente. As pessoas, hoje, vivem oitenta por cento   da sua vida em torno da doença. Dentro de poucos anos o mundo será um imenso hospital sem possibilidades de atendimento, sem recursos para ser gerido convenientemente. As pessoas, aprendendo o medo como uma lei social, vão dedicar-se à doença como não se dedicam aos amigos e aos parentes (Agustina Bessa-Luís, Dicionário Imperfeito, Guimarães Ed.).

E porque o mundo corre realmente o perigo de se transformar num grande e gigantesco hospital,  este livro procura chamar a atenção para os perigos desta transformação.

Não se trata, claro, de um problema novo e já no meu primeiro livro, Estarei mesmo doente, publicado em 1999, dedico o capítulo intitulado Medo e perigo de certos diagnósticos a este tema, àquilo que eu designo de Conflito do diagnóstico. Neste livro analisei em detalhe o impacto destrutivo e perturbador de certos diagnósticos, quer a nível cerebral, psicológico, quer a nível orgânico.

Este livro surge, também, de uma longa conversa com o filho de um paciente, que encontrei numa viagem de comboio entre Braga e Lisboa, uma conversa que se prolongou num jantar, em Lisboa. Uns dias depois decidi anotar as ideias principais da conversa, desenvolvendo apenas um pouco mais alguns pontos e daqui resultou este pequeno livro.  Transcrevi, quase na íntegra, as questões que me foram colocadas e isto explica a forma de diálogo deste livro.